Data da morte:15/04/1988

Local:Fazenda Poço da Vovó, distrito de Otinolândia - município de Monte Azul

A Fazenda Poço da Vovó era de propriedade da Universidade Federal de Viçosa (UFV), que não havia explorado o terreno, sendo, por isso, considerada terra improdutiva. A fazenda ocupava trecho de influência do Projeto Jaíba. Em 1985, cerca de 160 famílias de posseiros ocuparam uma área de 3 mil hectares e, desde então, sofriam ameaças do grileiro Pedro Trindade Filho, que tentava expulsá-las, derrubando barracos, queimando e destruindo plantações, para se apossar das terras.

Após um ano, em 1986, o grileiro entrou com um pedido de reintegração de posse na comarca de Monte Azul, que foi recusado pelo juiz por falta de documentação que comprovasse o domínio. Em fevereiro de 1987, Pedro Trindade tentou novamente expulsar os posseiros, mas desta vez com o apoio da UDR e da Polícia Civil. As casas de vários posseiros foram destruídas, inclusive a de Alaor Neres Miranda e sua esposa, Maria Geralda Ferreira, que estava internada no hospital para dar à luz sua segunda filha. Por causa da violência, apenas 90 famílias permaneceram no local antes mesmo da chegada da Polícia Civil.

O conflito entre os posseiros e o grileiro ia se agravando, aumentando a violência contra os que resistiam. Em abril de 1988 somente cinco famílias estavam no local, ocupando uma gleba de 15 hectares cada. Alaor e Maria Geralda continuavam plantando milho, feijão, mandioca e frutas no local e demoraram quase um ano para reconstruir o barraco, ainda que dividindo a moradia com Hermes Bispo da Silva e seu filho, Almir Queiroz da Silva.

No dia 14/04/1988, o comandante do destacamento de Otinolândia, sargento Plínio, da Polícia Militar, acompanhado dos jagunços Julio Ferreira da Silva (Julião) e Manoel Batista da Silva (Manelão) foi chamado por Pedro Trindade Filho para orientar os posseiros a abandonarem o local. Às 14h do mesmo dia, uma equipe de policiais militares de Janaúba, integrada por 11 detetives e comandada pelo capitão Osvaldo, também da Polícia Militar, foi à fazenda e, após três horas, com a ajuda dos mesmos jagunços, destruíram com motosserra os casebres dos posseiros, inclusive o barraco das famílias de Alaor Neres Miranda e Hermes Bispo da Silva. Eles tiveram que construir uma barraquinha de lona para se abrigarem. Havia duas crianças entre os desabrigados das famílias Neres Miranda e Bispo da Silva, sendo uma de 2 anos e outra de 9 meses.

No dia seguinte, Alaor foi até Otinolândia tentar resolver o problema da moradia e buscar remédio para uma de suas filhas, que estava doente, e, enquanto estava na cidade, os jagunços Julio Ferreira da Silva, Manoel Batista da Silva e Zinho, montados a cavalo, foram até o barraco de lona. Lá encontraram Maria Geralda, as duas filhas, Hermes e o filho Almir, sacaram os revólveres e disparam contra Hermes, matando-o na hora. Almir tentou fugir e foi perseguido pelos jagunços que estavam a cavalo, sendo atingido por quatro tiros nas costas. Maria Geralda também tentou fugir com as filhas, arrastando-se pelo mato, e ficou na mira do revólver do pistoleiro Zinho, que foi impedido de atirar pelos outros jagunços, que disseram que matariam apenas homens. Mesmo sem apresentar sinal de vida, Hermes ainda foi atingido a facadas pelos pistoleiros.

Em reportagem do jornal Estado de Minas, de 1º/05/1988 há o registro que diversas entidades sindicais (Fetaemg, Cut, PT, PCdoB, Associação Brasileira de Reforma Agrária, Sindicato dos Metalúrgicos de Betim e dez Sindicatos de Trabalhadores Rurais de Minas Gerais) foram na região conversar com trabalhadores e com os delegados de polícia de Jaíba e Janaúba, Raimundo Nonato e Carlos Barbosa, respectivamente. Eles informaram que os três pistoleiros acusados do crime estavam foragidos, provavelmente escondidos em Curvelo, e que faltavam condições para dar prosseguimento ao inquérito policial.

Representantes das entidades foram até o hospital e acompanharam a alta médica de Almir Queiroz da Silva, que voltou para casa. Com o assassinato de Hermes Bispo da Silva, os posseiros Alaor Neres Miranda, Maria Geralda Ferreira e Luciano Cardoso de Moura continuaram sofrendo ameaças de morte do grileiro Pedro Trindade Filho e precisaram se mudar para a casa de parentes. No mesmo dia da alta hospitalar de Almir, encontravam-se na fazenda quatro funcionários do Mirad, que faziam vistoria para avaliar a possibilidade de desapropriação para reforma agrária, uma vez que a UFV, proprietária legal, nunca havia explorado a terra. As últimas informações encontradas pela Covemg demonstram que não houve prosseguimento do inquérito policial e, até 2001, a propriedade ainda não havia sido transformada em assentamento.

O nome de Hermes Bispo da Silva consta nas publicações: “Camponeses mortos e desaparecidos: Excluídos da Justiça de Transição”, “Relatório final: Violações de Direitos no campo 1946 a 1988”, “Assassinatos no Campo: crime e impunidade 1964 – 1985” e “Fetaemg 30 anos de luta: 1968 a 1998”

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